Após anos de debate, o projeto foi aprovado na Câmara e agora será discutido pelos senadores. A (PEC 45/19) unificará e simplificará o modelo de tributação no país
Por Márcio Norberto
O projeto de uma reforma tributária no Brasil é discutido há algumas décadas. Há pouco mais de dois meses, no dia 7 de julho, a Câmara dos Deputados aprovou em duas votações – em primeiro turno por 382 a 118 votos e em segundo por 375 votos a 113 – a Proposta de Emenda à Constituição (PEC 45/19) que legislará sobre o novo modelo de tributação no país. O objetivo do projeto não é reduzir a carga tributária, mas unificar e simplificar a arrecadação de impostos sobre consumo.
A proposta aprovada pelos deputados agora será debatida no Senado Federal. De acordo com declarações na sexta-feira (18/8), do presidente do casa, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), a votação do projeto começará em outubro após amplo debate e também após ouvir todos os 27 governadores.
Para falar sobre alguns aspectos da reforma tributária e suas implicações no cenário econômico e produtivo do país, além de possíveis impactos no segmento de self storage, conversamos com o advogado Rodrigo Dias, que é sócio fundador da VBD Advogados.

Asbrass: É de longa data o debate acerca da reforma tributária no Brasil. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC 45/19) aprovada pelos deputados e agora em debate no Senado reúne aspectos de outras propostas de reforma. Gostaria que você comentasse sobre o projeto aprovado na Câmara.
RD: O projeto aprovado na Câmara é uma nova versão dos projetos apresentados no passado. A Câmara aprovou um novo texto dentro da PEC/45, que já estava sendo discutida no Congresso desde 2019. Algumas sugestões da PEC/110 foram levadas em consideração. Exemplo da criação do chamado IVA-DUA, um IVA da União e um IVA dos Estados e Municípios. Portanto, não podemos falar que se trata de um novo projeto ou um projeto do governo atual. Essa é uma proposta que teve origem na Câmara em 2019 e que foi sendo aperfeiçoada e negociada por todos esses anos.
Asbrass: Com a reforma, impostos como PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS que hoje são cobrados cumulativamente serão unificados num imposto único chamado IVA. Este modelo é adotado pela maioria dos países. Por que o Brasil demorou tanto a avançar neste sentido?
RD: O modelo IVA é adotado pela maioria dos países com economia desenvolvida. Mas é preciso lembrar que não é o único modelo. Estados Unidos, por exemplo, adotam um modelo diferente, chamado “sales tax”, onde a tributação só ocorre na operação final com o consumidor. A estruturação do modelo tributário brasileiro foi criada na década de 60. Existia uma preocupação de dar autonomia para Estados e Municípios. E essa autonomia é dada pelo poder gestão e arrecadação de recursos. A criação de um tributo com características nacionais poderia criar uma quebra em relação a essa autonomia. Esse ponto, inclusive, ainda é tema de discussão entre Estados e Municípios em relação à União. É fundamental que a regulação do novo tributo tenha essa preocupação.
Asbrass: De que forma a nova legislação tributária ao entrar em vigor impactará as empresas e os consumidores? Os impactos acontecerão de imediato, assim que a nova legislação passar a vigorar?
RD: O primeiro impacto é de justiça e conhecimento dos tributos. Com a reforma tributária, será possível que o consumidor entenda de forma clara o valor exato do tributo de consumo que incide sobre todas as atividades. Isso permitirá que a sociedade entenda o custo tributário envolvido em todo consumo realizado. Importante dizer que todas as atividades serão impactadas. Haverá uma nova ordem de relação entre preços de produtos. Um carro poderá passar a ter um preço menor em relação ao gasto com locação, por exemplo. A tendência é que haja uma transferência de tributos de bens industrializados para serviços e comércio. Mas sem termos o modelo completo da reforma, não temos como dizer quais serão esses impactos. Haverá produtos que precisarão aumentar o valor final ao consumidor e outros que terão espaço para reduzir o valor.
Asbrass: A reforma tributária é complexa e o que está em discussão é uma parte dela, ou seja, o aspecto da unificação dos impostos sobre consumo. Outros pontos precisarão ainda ser debatidos e amadurecidos como, por exemplo, taxar dividendos, isenção de IR para aqueles que ganham até R$5 mil, entre outros pontos. Como você avalia os próximos passos?
RD: Para este ano, o governo apenas anunciou a possibilidade de tributação das chamadas off-shores (Medida Provisória já apresentada) e a ideia de tributação dos fundos fechados. O novo governo ainda não apresentou qual seria o projeto de tributação dos dividendos. Para mim, antes da apresentação de qualquer nova reforma da renda, seria importante que o governo equalizasse as contas com a tributação que temos hoje. Para isso, seria fundamental uma discussão séria sobre a Reforma Administrativa. Definir o tamanho do Estado e como ele deve gastar seus recursos é primordial. Após essa etapa poderíamos olhar para a Reforma da Renda, com objetivo de corrigir eventuais distorções, melhorar o sistema para atração de investimentos, mas sem qualquer viés arrecadatório.
Asbrass: Trazendo os questionamentos para o setor de self storage, como podemos situar a atividade no contexto da reforma tributária, como a reforma impactará o setor? A reforma traz benefícios para o segmento?
RD: A reforma traz diversos benefícios a todos os setores. A criação de um sistema de tributação único evitará discussões sobre qual tributo é devido e para quem é devido. A atividade de self storage, por ser uma locação, terá um tratamento específico. Ainda não há definição de como será esse tratamento, mas é fundamental que a PEC tenha trazido essa preocupação já que a atividade com bens imóveis possui características específicas que não se comparam a nenhuma outra atividade. É por isso que diversos países que adotam o IVA aplicam às operações com bens imóveis regimes específicos.
Asbrass: Empresas do setor de self storage já foram autuadas pelo não pagamento de ISS, com a reforma o que muda para essas empresas?
RD: É preciso deixar claro que uma empresa que realiza atividade de self storage não realiza atividade sujeita ao ISS. Se a atividade de self storage é uma locação, não há ISS. Posto isso, precisamos entender se a empresa que foi autuada realizou mesmo uma atividade de self storage ou se estava realizando outro tipo de atividade. Para as atividades de self storage, o tratamento será aquele aplicado às atividades de locação. Para atividades que se caracterizem como serviço, não haverá mais ISS após a transição da reforma, elas pagarão apenas o novo imposto IVA (CBS + IBS).
Asbrass: Para o empresário e dirigente do setor de self storage qual é o principal ponto da reforma tributária?
RD: O mais importante é entender que estaremos diante de uma nova sistemática tributária. E isso demanda atenção de todos os empresários para que entendam como isso pode refletir em sua atividade. Muitas empresas precisarão repensar seus modelos de negócios. E quem já estiver olhando para isso sairá na frente. Em nosso escritório, temos auxiliado diversas empresas a entenderem o impacto da reforma em suas operações. Apesar de ainda não termos a definição de uma alíquota, já é possível analisar a estrutura de crédito e débito que será aplicada a partir da reforma. Além disso, é fundamental que as empresas revisitem seus contratos para entender se eles já estão preparados para o novo sistema que será implementado.